Sabe quem perguntou por você? Ninguém!

Sabe quem perguntou por você? Ninguém!
(Foto: Mihaly Koles/Unsplash)

 

Lugar de fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados por eles são publicados de acordo com um tema. O de agosto de 2020 é “solidão”.


Se você tem um livro, nunca está só. Começo a crônica com um clichê para falar da solidão.

Se você tem um amigo imaginário, não está só. Se você está mentalmente afetado, pode estar com a sala cheia sem ninguém saber. Algumas latas de cerveja podem fazer você ver duas pessoas em uma só. Um certo grau de astigmatismo também.

Estar só não é necessariamente ruim. Ir ao cinema só não é ruim. Ir a um café acompanhado só de um livro é uma delícia.

Mas é que às vezes a gente fica de saco cheio de estar só com a gente mesmo. É como quando dividimos um apê por muito tempo com a mesma pessoa. Só que, no caso, a pessoa é você.

Aí você inventa de casar e ter filhos e só se ferra. Lembra de como era bom poder fazer o que queria, na hora que queria. Assistir a um filme ruim da sessão da tarde pelado, jantar miojo, tomar Coca-Cola no café da manhã, acordar ao meio-dia no fim de semana. Quem liga?

Ninguém liga, e esse é o problema! Ao invés de estar pelado sozinho, podia estar pelado com alguém interessante. Ao invés de estar usando um abrigo de plush, poderia estar toda produzida em uma reunião com os amigos e quem sabe arrumar um namorado para depois casar, ter filhos e sentir saudade do tempo em que jantava miojo.

Trabalhar sozinho também pode ser bom porque você não precisa sair do Facebook quando o chefe entra na sala. Até porque é possível que você nem tenha chefe. Olha só, que alegria!

O problema é que nos dias de hoje é quase impossível ficar só, mesmo estando aparentemente sem ninguém. Porque sempre tem alguém chamando no Whatsapp, te marcando em uma foto no Instagram ou discutindo com você no Facebook.

E quando tudo o que você mais sonhava era se desconectar do mundo, pá! Vem o corona chutando a porta, trancando e levando a chave.

A quarentena nos ensinou um novo tipo de solidão: a solidão em família! Aquela culpa da mãe que trabalhava demais e não tinha tempo para ver os filhos vai embora, e agora o que ela mais quer é que o filho volte para a escola e ela para o trabalho. Porque fazer reunião à distância é um saco e faz mal para a vista. Você já sente náuseas só de ouvir a palavra live e tem vontade de se jogar pela janela quando os vizinhos do prédio decidem fazer ginástica coletiva na sacada.

E pra arrumar um crush, como é que faz? Convida o Drauzio Varella para sair? Pede pro boy vir até a sua casa, com um teste negativo de covid nas mãos? Marca um encontro para quando inventarem a vacina? Ou faz um brinde com cloroquina acompanhado de uma porção de ivermectina?

Só se for.

Andréa Martins, 41, mora em Presidente Venceslau. Trabalha como publicitária e tem uma coluna no jornal local.

 

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