Renascimento

Renascimento
(Foto: Arte Revista Cult)

 

Lugar de fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados por eles são publicados de acordo com um tema. O de dezembro de 2020 é “renascimento”.


Chegamos ao final de mais um ano, embora não se possa considerar 2020 (vinte-vinte) como apenas mais um ano.

Há 9 (nove) meses vivemos no Brasil as consequências da pandemia decorrente do Coronavírus que nos sacudiu das mais diferentes formas e para tantas esferas da vida. A respeito dos 3 (três) primeiros meses do ano, no entanto, sinto que a alteração da rotina, somada ao medo e ao distanciamento social nos trouxe uma sensação temporal distorcida que remeteu essas lembranças a um tempo demasiado distante do que de fato aconteceu. Apesar disso, algumas dessas lembranças nutriram nosso espírito em determinados momentos de um ano que nos convocou à consciência – conosco e com o próximo – ao bom senso, à resiliência, ao resgate do que de fato é essencial: – “tudo que nós tem é nós”, canta Emicida na minha cabeça enquanto escrevo – a vida, nossa saúde e nossos afetos.

O findar de um ano como 2020 traz algumas reflexões: todos nós passamos e seguimos passando por um momento difícil da história e teremos o que elaborar quanto a isso. Para quem não perdeu alguém próximo, o emprego ou o convívio social, há as sutis mudanças nas relações humanas que, em um país polarizado anteriormente à pandemia, só veio escancarar ainda mais os extremos quanto a ideais políticos e, consequentemente, humanos. Do desgaste na esfera política, o reflexo no comportamento de fadiga com relação à pandemia. Ainda há vida em você, mas o que ela significa depois de tudo o que vivemos em 2020? Desprovida do interesse no diálogo, na construção de pontes, no considerar que fazemos parte de um todo maior e de que é no coletivo e na troca que nos tornamos mais humanos, mas que isso exige disposição, responsabilidade, empatia, desconstruções e respeito, aprendizados para os quais fomos convocados ao longo desse ano, mas que, no entanto, tivemos dificuldade quanto à recepção e entendimento, de encará-los e por eles nos deixarmos transformar.

“Tenho sangrado demais, tenho chorado pra cachorro / ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro”, lembra-me Belchior. 2021 está logo ali e ainda há vida em você. Do lado de cá, eu desejo a mim e aos meus coragem, lucidez e sonhos, “ter peito e espaço pra morrer e renascer”, como canta a portuguesa Sara Tavares. Que possamos receber o porvir com o coração aberto à cura, ao novo e ao outro. A natureza e a vida pedem passagem e eu lembro uma última vez Emicida: “enquanto a terra não for livre, eu também não sou”.

Juliane Lino, 34, é educadora musical
em Francisco Beltrão, PR.

 

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