“O país impossível”, de José Brandão, e outros lançamentos

“O país impossível”, de José Brandão, e outros lançamentos

 

No novo livro de poesia de José Brandão, deparamos a construção crua e cruel de um projeto de Brasil que, nos últimos anos, tem prevalecido na vida nacional: “país kafkiano”, “a caminho da destruição”, “triste como um urubu”, como trazem alguns títulos dos 48 poemas reunidos em O país impossível. Cada poema, já no título, qualifica algum aspecto da experiência contemporânea com o Brasil, indo de seus cenários desoladores de miséria e injustiça social às cenas dos poderosos que festejam sobre os espólios da nação e “oferecem as mulheres aos turistas/ e dão risada”. Como nota Eduardo Carbone na orelha do livro, podemos perceber alguns traços em O país impossível que já caracterizavam a escrita de José Brandão desde suas publicações na década de 1990, quando “o poeta já desenhava uma paisagem claríssima, explícita, do nosso tempo e lugar, onde e quando a realidade maravilha e fere”.

Clássico da literatura fantástica e de terror, a mais conhecida novela do escritor galês Arthur Machen ganha nova tradução no país. O enredo centra-se nas misteriosas mortes que rondam a jovem Helen Vaughan, que guarda uma relação insuspeita com uma experiência científica realizada no final do século 19: o dr. Raymond, tentando romper os limites sensoriais do corpo humano e desvelar a “realidade” que subjaz nossa visão de mundo, realiza uma cirurgia no cérebro de sua companheira, que fica louca após o procedimento. O primeiro capítulo, que narra a cirurgia, foi originalmente publicado como um conto independente, ao qual foram acrescidas as demais narrativas que formam O grande deus Pã. Tal composição esparsa também cria um efeito curioso, pois cada capítulo apresenta novos personagens e acontecimentos em torno de Helen Vaughan, compondo uma trama que, a cada momento, parece cercar mas nunca atingir o núcleo do mistério: o mal em sua forma absoluta. Esse terror indescritível, que não pode ser comportado pelas palavras humanas, ecoa o terror cósmico de H. P. Lovecraft, que muito se inspirou na obra de Arthur Machen.

No romance de Leonardo Garzaro, o centro dos acontecimentos é ocupado por uma das mais antigas atividades humanas: o ato de nomear. Em uma trama de diferentes histórias, em que personagens e narrativa se misturam, o escritor “aponta para uma curiosa inferência: a de que nos tornamos humanos no momento em que demos o primeiro nome”, como vem registrado na orelha da obra. Assim, lemos sobre um barão que, aficionado por nomear suas posses, trava um embate com a esposa para nomear seu sétimo filho; ou sobre a frustração de Pinga Brava que, mesmo após comprar um título de nobreza, ainda é chamado pelo apelido com o qual ficou conhecido como dono de uma rede de botecos; ou sobre um sambista que acredita não ser reconhecido pelo seu nome de batismo, Joãolenon. Para a crítica literária Thais Rodegheri Manzano, trata-se de “uma explosão de criatividade em um romance barroco”.

Estruturado na forma de um diário, o romance acompanha um ano da vida de Dênis Saverin, jornalista de direita que comenta os acontecimentos políticos e pessoais que presencia. Sua visão de mundo conservadora, no entanto, começa a ser abalada quando conhece Rafaela, uma artista de esquerda. Ao lado da jovem ruiva, Dênis passa a frequentar aulas de arte, feiras do MST, a Parada do orgulho gay, a Marcha da maconha e mesmo uma ocupação liderada por Guilherme Boulos. A princípio agindo como um jornalista infiltrado, ao pouco vemos as convicções do narrador vacilarem diante dos sentimentos mobilizados pela artista. O romance se constitui, assim, como “a tentativa de elaborar em literatura um trauma histórico”, como registra a orelha da obra.

Associado a autores como Franz Kafka e Julio Cortázar, o romance do romeno Mircea Cartarescu estrutura-se em cinco partes independentes. Na primeira, que é uma espécie de prólogo, o leitor é introduzido a uma Bucareste pré-guerra e acompanha a narrativa improvável de um velho e moribundo escritor. Na segunda, com um forte tom do realismo mágico, lemos sobre a trajetória de um messias pré-adolescente que vê desaparecem-lhe os poderes. Na terceira somos levados ao cume do amor romântico entre dois adolescentes, que acabam por trocar de almas. A quarta, assim como o livro de maneira geral, é guiada pela memória, na figura de uma mulher de meia idade que se relaciona amorosamente com um estudante universitário enquanto rememora suas experiências infantis. Por fim, entramos na espiral fora de controle de um homem que fica obcecado com a buzina de seu carro. Por problemas com a censura da Romênia, a obra só foi publicada em sua forma integral em 1993, quatro anos após sua primeira aparição sob outro título.

 


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