Michel de Montaigne e os enigmas da causalidade

Michel de Montaigne e os enigmas da causalidade
Montaigne volta ao ceticismo, no século 16, para entender o “Novo Mundo” que se inicia com o colonialismo europeu (Imagem: Reprodução)
  1 Um dos alvos prediletos do ceticismo grego, em meio ao combate que dedicava ao dogmatismo filosófico de sua época, consistiu na crítica e na atenção ao tema da causalidade: em que sentido se pode dizer, sem dogmatizar, que algo causa algo? Sendo o dogmatismo um hábito cognitivo que explica o que aparece tomando por fundamento aquilo que não aparece, o tema da causalidade é-lhe essencial. A listagem dos invisíveis dotados de tal pretensão é incontável: são os átomos de Demócrito a gerar a errática materialidade de inúmeros mundos visíveis e possíveis; é a faina do Demiurgo platônico, empenhado na materialização do imaterial – na aporia-mãe na qual se fundará todo o dogmatismo futuro –; são, por fim, todas as metafísicas da Unidade primordial e inteligível, afirmada como passo necessário e fundante da variada sensibilidade do mundo. É, ainda, se quisermos, a arcaica demanda por sentido, já presente na obsessão mitológica pelo tema da geração de todas as coisas, uma espécie de forma vazia que viria a ser ocupada tanto pela filosofia dos pré-socráticos como a de seus sucessores, cada vez mais vetustos pelos tempos afora. Sem falar da mais complexa etiologia emergente entre os antigos, a saber, a proposta por Aristóteles, em sua sofisticada tipologia da quádrupla causalidade. O dogmatismo filosófico originário, no esforço de explicar o visível por meio do apelo ao invisível, impôs a si mesmo a tarefa de demonstrar como o primeiro engendra o segundo. Não há, portanto, dogmatismo desacompanhado de uma etiologia fund

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