Crônica do tempo

Crônica do tempo
(Foto: Lisa Cope/ Unsplash)

 

Lugar de Fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados por eles são publicados de acordo com um tema. O de julho de 2020 é “tempo”


Pensei em falar sobre o tempo, mas temi perder-me em sua imensidão.

O Tempo e o Espaço são as dimensões onde navegamos pela vida, e realizamos e conhecemos e percebemos e concebemos e desejamos e imaginamos tudo a que somos capazes de. Mas nunca podemos alcançar os seus limites. Além do Tempo e do Espaço, só Deus… Se é que Eles não se confundem.

Mas dizem que o Tempo não existe em si. Realmente, ninguém jamais tocou no Tempo, num pedacinho dele sequer. Nenhum cientista prova a sua existência, digamos, laboratorialmente.

Aí é que entra o Espaço: Só percebemos o Tempo ao nos deslocarmos pelo Espaço, ainda que mentalmente, o que sempre custa um certo tempo…

E o Espaço, por sua vez, também não pode ser apreendido, tocado, examinado em si. Mas somente observado/experimentado por meio do deslocamento de um objeto, ou do próprio indivíduo, nele. Ao longo do Tempo, claro!…

Espaço–Tempo: onde tudo acontece ou deixa de acontecer! Acho que Einstein se ocupou disso ao longo do tempo…

O Tempo é, pois, “estudado” pelos físicos.

E também pelos filósofos, porque nenhuma equação física pode expressar a sua natureza nem indicar com certeza os seus limites – o que os filósofos especulam, meta-fisicamente.

E os filósofos se perdem na meta-física, onde se encontram com os teólogos, que se guiam por seus deuses. Deus meu!

Mas percebo que, imprudentemente, embarguei-me na Física e caí na Teologia, e vou me perdendo no Tempo…

Volto à minha embarcação, a Literatura. A Literatura também pode nos levar a tempos além de nossa estreita realidade: a ficção nos leva até mesmo além dos domínios da Física, da Filosofia, da Metafísica e, creiam-me, da Teologia. A poesia, então!

Mas o meu veículo não é desses de potência atômica, que mergulham nos abismos dos céus e dos mares.

Não! É simplesmente um bote que navega no córrego que corre nos fundos de meu quintal, e não vai muito longe: é a crônica.

E me dou conta: crônica, cronos, tempo!

Então, nada mais próprio de que uma crônica para falar do Tempo.

Não o Tempo físico, filosófico, metafísico ou teológico, o Tempo absoluto. Mas o pequeno fragmento dele que vivenciamos/percebemos; o tempo, digamos, psicológico.

Porque o Tempo-tempo pode também ser medido pela nossa subjetividade. E aí ele é um fenômeno psicológico.

Cada um tem o seu tempo…

E esse “tempo pessoal” passa em velocidades diversas, de acordo com a idade do indivíduo: às vezes, anda devagar; às vezes, depressa; outras vezes, corre e até voa, especialmente depois que o indivíduo alcança a maior-idade, que alguns dizem ser a melhor…

Idade: um “pedaço” do Tempo relacionado a uma vida, normalmente biológica, quase sempre animal e preferencialmente humana.

Pois agora cheguei ao assunto desta crônica: idade humana.

Estava pensando nisto: o tempo acelera na medida em que o homem e a mulher caminham pela estrada da vida (acho que já ouvi semelhante expressão numa música sertaneja antiga).

Tanto assim que, aos meus vinte anos de idade eu já havia percorrido mais de um universo, realizado façanhas, experimentado uma infinidade de coisas, vivido uma eternidade.

Agora, tento lembrar-me do que andei, fiz, experimentei, vivi nestes últimos vinte anos.

Parece-me que o ano dois mil foi ontem, e eu – disse “parece-me” – estou como estava então…

Oh, tempo meu,

quanto mais eu fico lento,

mais tu andas depressa;

quando tento de agarrar

tu te escapas de mim!

 

Francisco Dias Teixeira, 66, é escritor. Procurador da República
aposentado, é bacharel em Direito (PUC/SP) e Filosofia (USP)

 

Deixe o seu comentário

TV Cult